sexta-feira, 11 de maio de 2012

Serejo - Melancolia dos artistas

 Por: Vicente Serejo

Os versos da poetisa sul-africana Ingrid Jonker viraram película, que já está em cartaz nos cinemas. O filme “Borboletas Negras”, inspirado em um documentário holandês e dirigido por Paula Von der Oest, conta a história da escritora que viveu na época do Apartheid (regime de segregação racial vigente de 1948 a 1994) e ficou conhecida quando Nelson Mandela leu seu poema “A Criança que foi Assassinada pelos Soldados de Nyanga”, no seu primeiro discurso como presidente da África do Sul.

As questões do racismo são destacadas, mas chama a atenção o temperamento melancólico da escritora – característica comum em quem decide seguir a seara da arte. O conflito com o pai Abraham Jonker, que não reconhecia o talento literário da filha e a rejeitava, permeia a trama e justifica boa parte de seus comportamentos.

O genitor era membro do Partido Nacional do Parlamento e um dos responsáveis pela manutenção do Apartheid e Ingrid lutava justamente contra o governo segregacionista, o que estimulava o descontentamento de um com o outro. A harmonia nunca chegou a acontecer.

“A criança é a sombra escura dos soldados com fuzis e cacetetes. Essa criança que só queria brincar ao sol em Nyanga e em qualquer lugar… A criança cresceu em jornadas gigantes por todo o mundo. Sem uma passagem(…)”.

O desabafo de Ingrid pelas crianças negras em seus escritos pode representar seu próprio desabafo pela vida incompleta, pels relações incompreendidas. Depois de viver a inocência, ela não conseguiu suplantar seus conflitos, a medida que amadurecia. Desconheceu a experiência do perdão e da liberdade em relação às expectativas alheias. Não elaborou suas fases de desenvolvimento e o pai nunca foi ressignificado. A mágoa assolou sua e existência, destruindo sua sanidade e impedindo sua plenitude e felicidade. A melancolia mal canalizada leva a um “luto” que nunca é resolvido

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