Um
dos aspectos frustrantes da medida provisória editada pela presidente Dilma
Rousseff, de forma casada com vetos pontuais ao Código Florestal aprovado pelo
Congresso, é a redução das exigências legais para a recuperação de nascentes.
Os legisladores do Planalto introduziram deliberadamente no texto da medida a
expressão “perenes”, com o intuito de excluir dessas exigências as nascentes
intermitentes que, frequentemente, ocorrem em regiões com menor disponibilidade
anual de água.
Diante
da reação de espanto com a introdução, por moto próprio do Planalto, de mais um
retrocesso na legislação florestal, circulam rumores em Brasília de que a ANA
(Agência Nacional de Águas) será convocada a publicar uma nota técnica
sustentando que “intermitente” também é “perene”, de modo a evitar uma reedição
da medida provisória pela presidente.
Além
disso, a medida provisória também consolida a redução da extensão das áreas a
serem reflorestadas ao redor das nascentes. Enquanto a lei revogada na
segunda-feira indicava um raio de 50 metros ao redor de qualquer nascente, a
nova lei mantém esta metragem apenas para as nascentes já protegidas, não
desmatadas. Para fins de recuperação, a exigência máxima passa a ser de 15
metros, chegando a apenas 5 metros para as propriedades de menor extensão.
Observa-se
aqui a mesma lógica perversa aplicada a vários outros dispositivos do texto
legal: quem cumpriu a lei revogada será punido com a manutenção do mesmo nível
de exigência e com um conceito de nascente amplo; os que descumpriram a lei –
desmatando, aterrando e reduzindo a disponibilidade de água – serão premiados
com uma anistia que começa com a introdução do adjetivo “perene” ao conceito e
por uma anistia florestal, para fins de recuperação, que variará de 70% a 90%,
supondo-se a manutenção de mais essa excrescência na legislação.
Ninguém,
em sã consciência, acredita que os órgãos ambientais locais se darão ao
trabalho de aferir tecnicamente quais são as nascentes intermitentes e as perenes
na sua área de jurisdição. Ou que sairão demarcando círculos de vários
tamanhos, de acordo com as extensões das propriedades privadas constantes das
matrículas de cada cartório. A própria lei, ao introduzir diferenciações que
multiplicam por mil as dificuldades de monitoramento e controle ambiental,
induz ao nivelamento por baixo.
É
este o sentido da palavra “consolidação”, tão presente na retórica ruralista
durante todo o processo de revisão do Código Florestal. Ele significa, na
verdade: “fica legalizado o que foi destruído”. Já a responsabilidade de
preservar alguma coisa do ativo florestal existente em áreas privadas fica para
os “otários” que cumpriram a lei e, agora, verão suas propriedades
desvalorizadas em relação às de quaisquer vizinhos predadores.
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