Ambas
levavam a vida adubando a terra e semeando, cuidando da mata e dos bichos, mas
cuidaram mesmo foi de gente, especialmente dos injustiçados. Ambas foram
radicais e não faziam concessões na defesa do que acreditavam, porém suas
radicalidades tinham um quê de ternura, de afeto e de leveza, pois o que lhes
impulsionava era o amor à vida em toda a sua plenitude. Uma conhecido movimento
pastoral, pois a partir dos anos 1990 não havia uma reunião para se discutir a
Amazônia na perspectiva dos mais simples que seu nome não fosse citado. A outra
tive o privilégio de conhecer pessoalmente e de aprender muito com seus
ensinamentos.
É
sobre esta que escrevo o que dela conheci no dia a dia. A casa que construiu
não tem portas nem janelas, visto que sempre está aberta a todas as pessoas do
mundo, de várias línguas, de diferentes credos, alguns buscando aprender,
outros contribuindo e outros tantos apenas experimentando outro modo de viver.
Para ela não havia felicidade maior do que acolher e compartilhar.
Tive
o privilégio de assistir ao crescimento de seus filhos e à casa inteira se
transformar de doces, de mel, de amor em experiências de solidariedade como se
aquela casa no interior da Amazônia fosse um cantinho construído para mudar o
mundo.
Há
pouco mais de um ano Ela nos deixou, quando um mal súbito nos privou de seus
ensinamentos, conselhos, receitas naturais e da alegria de acolher. Foram uns
poucos dias de sofrimento e ela, que cuidava de todos, não cuidou
suficientemente de si e foi cuidar de outros num recanto qualquer do universo.
Lembro-me
com exatidão do seu velório, em que acadêmicos, intelectuais, membros de
organizações sociais, políticos, sobretudo gente simples, vieram de vários
lugares para lhe prestar homenagem. Era um dia de domingo e a mãe terra que ela
ajudou a cultivar a recebeu para sempre. A terra estava úmida, resultado das
primeiras chuvas de dezembro a contradizer-se com o sol escaldante de uma morna
manhã. A floresta dava contorno ao cenário. Ouvia-se um longo silêncio, nada
havia para se dizer. Palavra alguma seria capaz de expressar o que foi essa
grande mulher que escolheu a Amazônia para viver. Com ela se foi um pouco de
cada um que estava ao seu redor e de outros tantos espalhados pelo mundo.
Conosco fica vivo seu exemplo de coerência e dedicação às boas causas e a
memória de luta e persistência em defesa da Amazônia e de sua gente.
O
silêncio foi rompido pelo canto de um pássaro a encorajar as últimas
homenagens. Em seguida, até o pássaro cessou seu canto e novamente predominou o
silêncio, como para expressar, que nessas ocasiões nada há a dizer, o silêncio
comunicou o estado de espírito.
Para
duas grandes mulheres, Dorothy Stang e Doroti Schwade simplesmente uma palavra:
obrigado, seus exemplos continuarão, pois lutar é preciso.
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