sábado, 13 de outubro de 2012

Serejo: Preguiça & Preguiça

Por: Vicente Serejo

Ninguém pode por em dúvida o preparo intelectual de Marco Antônio Villa, professor de ciências sociais da Universidade de São Carlos, historiador da Revolução Constitucionalista de 1932 e biógrafo de João Goulart. Nem de seu bom humor. Basta lembrar seu artigo comparando Lula ao novo D. Sebastião, aquele por quem se espera, até hoje, apesar de morto e sepultado no Mosteiro dos Jerônimos, derrotado que foi na famosa batalha de Alcácer-Quiber e que um dia virá para retomar aquele reinado que é dele.
Mesmo assim, a não ser por blague, entendi o professor Villa no artigo que publicou na Folha de S. Paulo, ao tratar do desamor ao trabalho justamente do ministro do trabalho, nosso Brizola Neto. Para ele, e transcrevo o trecho final da frase, a passagem de sua excelência pela
pasta ‘é a de um adepto radical de Paul Lafargue, autor do clássico O Direito à Preguiça’. Posto assim, Senhor Redator, senti na própria carne a acusação, pois não era a preguiça no sentido pejorativo a tese que Lafargue defende e agrada.

O artigo, publicado na edição de trinta de julho, acabou contestado também na Folha de S. Paulo no dia 8 de agosto. No seu ataque bem humorado, Villa percorre a agenda de Brizola Neto nas suas andanças ministeriais, o que classifica de bizarro, e atira com ironia quando compara o neto de Leonel de Moura Brizola a Alexei Stakhanov, pai do chamado ‘stakhanovismo’, na sua busca de elevar ao máximo a produção naquela União Soviética de 1935, antes de desmantelar-se por gerar disparidades salariais.

Villa não repetiu o bordão de Macunaíma, personagem genial da rapsódia modernista de Mário de Andrade – ‘Ai que preguiça! – ao classificar de espírito macunaímico as escapadas do senhor ministro. Melhor. Ele sabe que a preguiça de Lafarque é outra, e um direito legítimo ao defender as horas de lazer e descanso dos trabalhadores. Nas bastasse a sua condição de genro de Karl Marx, casado com Laura, Lafargue foi saudado nos funerais por Lenin por sua participação na redação dos extratos de O Capital.

A blague do historiador da Revolução Constitucionalista de 1932, naquela São Paulo das garoas finas, como no verso de Mário de Andrade, foi contestada por Fernando Brito que outra qualificação não apôs ao seu nome a não ser de ‘jornalista e chefe do gabinete do ministro’. Bom observador, Brito foi ao ponto crucial do texto de Villa, sua omissão da preguiça como um direito por uma jornada de trabalho mais digna e humana, o que não justificaria os privilégios do senhor ministro nas suas viagens sem fim.

Irônico e certeiro, demonstrando uma boa capacidade de manejar com as palavras, Fernando Brito, o assessor do ministro, soube expor sem hesitar o erro do professor Marco Antônio Villa ao recortar o título da tese de Paul Lafargue – ‘O Direito à Preguiça’ – e usar como se fosse um direito à vadiagem ao lado de Macunaíma. Claro que o professor sabe, mas pecou por tentar confundir a preguiça lafarguiana com a preguiça macunaímica, aquela do herói sem nenhum caráter, nascido no fundo do mato dentro.

 

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