Por
Vicente Serejo
Seria uma tolice imaginar que só a
literatura, por ser feita quase sempre nas usinas intelectuais, ficaria imune
ao marketing. Logo a literatura, refogada no azeite da vaidade humana e no
brilho dos egos polidos. Jamais dispensaria. Não pelo sofrimento de alguns dos
seus grandes nomes que levaram décadas a espera de um reconhecimento que,
embora justo, lhes era negado durante anos e anos. É que a fome de glória é
feroz, ainda que algumas vezes possa custar bom dinheiro ou tráfico de
influência.
E essa fera faz mitos e vítimas.
Outro dia o caderno ‘Prosa e Verso’ de O Globo, publicou uma página inteira
sobre o que chamou ‘Elogios de Aluguel’. A história de um habilidoso americano
com fortes inclinações para o falso, de nome Todd Rutherford, que depois de
muito trabalhar e pouco ganhar em empresa especializada em estimular jornais e
blogs a resenharem livros auto-publicados, teve um estalo: inventou, ele mesmo,
um birô de produzir resenhas para impressionar leitores fáceis.
Ora, não foi difícil, registra a
matéria assinada por David Streitfeld, do New York Tomes. Com mais algum tempo,
e como oferecia nos seus textos tudo quanto os clientes queriam que se
publicasse sobre seus livros, tipo ‘lírico e envolvente’ ou ‘assombroso e
tocante’, Todd Rutherford formou grande clientela própria. Abriu um site e, sem
dizer, tinha uma tabela: resenharia um livro por 99 dólares; vinte por 499; e
cobraria 999 dólares se o cliente desejasse ter um pacote de cinquenta boas
resenhas.
Dirá o intrépido leitor: não é
caro. Não é, mas também não é esta a questão. O problema é que um belo dia,
quando já faturava uma média mensal de 28 mil dólares, e um acervo de 4.531
textos vendidos, o equivalente no Brasil a mais de 50 mil reais, uma jovem
escritora de 24 anos não gostou da resenha que pagara e o denunciou em vários
sites. O Google reagiu e fechou a conta publicitária de Rutherford alegando que
não aceitava resenhas pagas e a Amazon derrubou alguns dos seus textos.
Bing Liu, um professor da
Universidade de Illinois, publicou um estudo em 2008 onde aponta que 60% das
resenhas da Amazon concedem cinco estrelas. Ele estima que ao menos um terço
dessas resenhas sejam falsas, mas é impossível provar quando são escritas por
publicitários ou vendedores, ou até pelos próprios autores usando pseudônimos.
No universo virtual tudo é possível. E o leitor, muito mais o leitor inexperiente
e sem informações consistentes, acredita nas indicações de leitura de sites.
Guardadas as proporções, Senhor
Redator, não estamos longe da prática desse hábito nesta Aldeia Velha. Se não
há resenhas pagas, temos por serviços de redação e revisão que alguns editores
profissionais chamam de preparação de originais. Em alguns casos, já estamos
contratando tudo: pesquisa, redação, revisão e, se possível, o brinde de um
artigo elogioso. Anote: mesmo que o autor seja gato de verdade, o livro pode
ser uma lebre enganadora. É o que dizem por ai. Amanhã tem mais.
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