sábado, 13 de outubro de 2012

Serejo: De ser avô

Por: Vicente Serejo

A gente não fica avô quando nasce o primeiro neto. Logo ali, naquela hora. Pelo contrário: quando vi Alberto, hoje com sete anos, do outro lado daquele vidro, como um aquário, a sensação foi de um prazer tão intenso que desabei emocionado. Mas, voltemos ao ponto inicial. A gente fica avô aos poucos. À medida que o mundo vai ensinando. Avô só tem mesmo uma utilidade: saber disfarçar o riso quando eles pintam e bordam e os pais fazem aquelas caras de agradáveis patetas fracassados.

A coisa pior nesta profissão sublime de amar sem nada pedir em troca, devo confessar, é conversar sobre neto. Coisa que tenho evitado para não torturar meus poucos leitores. Basta o que já exigem deles os advogados dos réus do mensalão com seus anjos imaculados. Pois bem, resisto. Mas tudo tem um limite, Senhor Redator. Como vi outro dia num pedaço de filme na tevê, numa dessas madrugadas, quando um menino de sete ou oito anos, se tanto, pergunta ao pai o que é masturbação.

Até nem parecia que uma tragédia cairia sobre o pai. Ele então foi respondendo, catando as palavras, enfrentando o incômodo das dúvidas. Quando caminhava para o desfecho da pobre e tímida descrição, veio o primeiro foguete: ‘Órgão sexual que o senhor fala é o pinto, papai?’. Saiu-se bem, de fato. Confirmou. E sem deixar espaço, lançou a frase seguinte na busca de chegar ao final. Veio então o segundo míssil: Papai, o que é friccionar? Outra breve a incômoda explicação com gestos tímidos.

Aliás, rememorando a cena, acho que aquele pai, de tão enrolado, devia ser um austero auditor da Receita Federal ou um perito em cálculos atuariais. Só sendo. Nunca vi tanta dificuldade. Quando mais tentava ser claro sem chocar o filho, mais mergulhava como um náufrago em águas de um redemoinho que antigamente a gente chamava de caldeirão. Mas o pai ia resistindo, fazendo das tripas coração, nos seus pobres limites. Era preciso ter fôlego, altivez, e uma naturalidade a toda prova.

Chega a um momento que o pai resolve recomeçar a explicação, agora de forma mais simples e mais direta, mas pelo jeito sem maiores detalhes. E foi descrevendo o sexo dos meninos e das meninas. O futuro – logo senti seu drama – era seu maior problema. Precisava explicar que o pinto tinha algo de mais importante e nobre a desempenhar no futuro, mas só quando ele ficasse grande. E chegasse à idade certa, repetia precavido. O menino calmo, olhos e ouvidos acesos, registrando todos os detalhes.

O pai já retomava a leitura do jornal que deixara de lado, quando viu que o neto queria falar. Veio aquele silêncio terrível que antecede aos grandes terremotos. Foi então que o menino, como que meio decepcionado com a novidade, disse para o pai, depois de todo esforço da explicação: ‘Ah, pai, isso é a mesma coisa de punheta!’. Aqui, confesso: se Albertinho pedir uma explicação dessas a mim quem vai responder é o pai. Que além de advogado, é muito mais moderno que um pobre avô de doze.

 

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