sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Drummond: Hino Nacional


Só pra (re)lembrar a diferença entre poeta e metrificador
In: INFÂMIA   (www.jairolima.org)


Carlos Drummond de Andrade


Hino nacional


Precisamos descobrir o Brasil!

Escondido atrás as florestas,

com a água dos rios no meio,

o Brasil está dormindo, coitado.

Precisamos colonizar o Brasil.


O que faremos importando francesas

muito louras, de pele macia,

alemãs gordas, russas nostálgicas para

garçonetes dos restaurantes noturnos.

E virão sírias fidelíssimas.

Não convém desprezar as japonesas...


Precisamos educar o Brasil.

Compraremos professores e livros,

assimilaremos finas culturas,

abriremos dancings e subvencionaremos as elites.


Cada brasileiro terá sua casa

com fogão e aquecedor elétricos, piscina,

salão para conferências científicas.

E cuidaremos do Estado Técnico.


Precisamos louvar o Brasil.

Não é só um país sem igual.

Nossas revoluções são bem maiores

do que quaisquer outras; nossos erros também.

E nossas virtudes? A terra das sublimes paixões...

os Amazonas inenarráveis... os incríveis João-Pessoas...


Precisamos adorar o Brasil!

Se bem que seja difícil compreender o que querem esses homens,

por que motivo eles se ajuntaram e qual a razão

de seus sofrimentos.

Precisamos, precisamos esquecer o Brasil!

Tão majestoso, tão sem limites, tão despropositado,

ele quer repousar de nossos terríveis carinhos.

O Brasil não nos quer! Está farto de nós!

Nosso Brasil é no outro mundo. Este não é o Brasil.

Nenhum Brasil existe. E acaso existirão os brasileiros?


Quanto a mim, sonharei com Portugal


Às vezes, quando

estou triste e há silêncio

nos corredores e nas veias,

vem-me um desejo de voltar

a Portugal. Nunca lá estive,

é certo, como também

é certo meu coração, em dias tais,

ser um deserto.


 

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