sábado, 20 de outubro de 2012

Serejo: Como?

Por: Vicente Serejo

 Disse a mim mesmo, Senhor Redator: vou assistir aos programas eleitorais como se fosse um estrangeiro. Sem preconceito. Sem prevenção. Faz de conta que não conheço nenhum deles, nunca os vi, nem ouvi. E fiquei lá, quieto, olho na tevê. Disposto a ouvir a conversa, os planos, as intenções. Como se fosse possível colocá-los acima de suas próprias histórias, embora sabendo que o marketing sabe inventar anjos e demônios. E num caso e noutro com uma perfeição de comover açougueiro.

 Queria olhar tudo como se o voto não tivesse aquela sua ambigüidade terrível de encontrar na urna sua fonte de energia e ao mesmo tempo seu próprio túmulo. O que vale o voto depois do dedo indicador apertar a última tecla e cair na memória virtual da urna eletrônica? Nada. De forte objeto do desejo, é como se de repente a libido dos candidatos fugisse. E se escondesse em algum lugar da pobre e frágil carne humana. Nada é tão inútil como o voto depois que salta do eleitor e cai na urna.

 Mas era o primeiro dia de programa do que chamam de propaganda eleitoral gratuita. E não era hora de fazer tolas conjecturas. Da rede, liguei a tevê, larguei o que estava lendo, e acomodei os olhos na direção da tela. Veio o primeiro candidato. Depois o segundo. Em seguida, mais outro e outro. Todos com declarações de amor e respeito a Natal. Uns afoitos, prometendo uma revolução; outros bem íntimos, garantindo trabalho. E todos, absolutamente todos, jurando servidão ao povo.

 A prefeita Micarla de Sousa é o estorvo. Só foi citada como irresponsável. Ela recebeu apoio do senador José Agripino quando todos os outros, imprensados e sôfregos, ficaram ao lado de Fátima Bezerra alisando o pêlo do Palácio do Planalto. Hoje, Fátima diz que o melhor prefeito é o deputado Fernando Mineiro. O senador Garibaldi Filho discorda e afirma logo que é Hermano Morais. E a governadora Rosalba Ciarlini parece que acredita em Rogério Marinho. Ora, a política é dinâmica.

 As candidaturas de esquerda cumprem o papel de sempre: colaram os seus retratos no álbum de figurinhas, e pronto. Se o socialismo já tinha suas dificuldades, depois do PT a coisa piorou muito. O eleitor comum não sabe mais o que é socialismo. Das tevês caem no chão os milhões e milhões de reais das cornucópias do mensalão. E se ministro do Supremo é pra dizer a verdade, danou-se tudo: são muitos os crimes de peculato, lavagem de dinheiro, corrupção ativa e passiva, o diabo a quatro.

 Deus, bom e justo, sabe que enfrentei aquela meia hora de propaganda eleitoral com a altivez e o destemor de um legionário. Poderia dizer que admirei a coragem de uns, a habilidade de outros, a desfaçatez de outros mais, e a nenhum neguei os olhos e os ouvidos. Vi e ouvi com alma de monge tudo que disseram. Talvez quatro anos não bastem para as tão grandes promessas. Mas vi e ouvi tudo.  Admirando a inteligência humana. E com certa inveja de não tê-la, é bem verdade. Mas vi e ouvi.

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