sábado, 13 de outubro de 2012

Serejo; Camarão Pernambucano

Por: Vicente Serejo

Dura mais de um século, Senhor Redator, a dúvida em torno da naturalidade de Felipe Camarão e até hoje há quem queira tê-lo entre nós. Aqui tem palácio com seu nome, bairro, rua e escola. No passado tivemos historiadores aguerridos – Câmara Cascudo e Nestor Lima – sem falar em dois célebres defensores da naturalidade potiguar, Pandiá Calógeras e Afonso Celso – convencidos de que sua certidão de nascimento é timbrada aqui, onde foi menino aprendendo a ser guerreiro nas gamboas do Potengi.

Não fui contemporâneo das velhas batalhas, mas fui o repórter que entrevistou o historiador Olavo Medeiros Filho, no Instituto Histórico, quando concluiu a pesquisa e constatou, para dissabor de algumas almas altruísticas, que Felipe Camarão, o herói, é pernambucano. Publiquei a entrevista numa página inteira de O Poti. O efeito foi tão espantoso que dias depois Alvamar Furtado desabafou, desolado, ao encontrar com ele numa reunião da Academia: ‘Olavo, assim você termina acabando com nossos heróis’.

Vistos e revistos papéis e livros velhos, fica mais fácil constatar que, a rigor, o primeiro disparo forte em favor de Pernambuco saiu da pena do grande Pereira da Costa, saudado por Cascudo no seu centenário, 1951, e depois seu justo e fiel advogado invocando a jurisprudência da admiração, ao escrever ao então governador de Pernambuco, Eraldo Gueiros. Com a cumplicidade de Mauro Mota, pediu a nova edição do Folclore Pernambucano que circulara originalmente em 1908. Saiu e sua carta foi o prefácio.

Voltemos aos velhos alfarrábios. O primeiro artigo de Pereira da Costa é publicado pelo Diário de Pernambuco em 1907, mas seu texto formal e completo sai dois anos depois, em 1909, como separata da Revista do Instituto Arqueológico e Geográfico de Pernambuco: ‘A naturalidade de D. Antônio Felipe Camarão, última verba’. A polêmica cresce e aquece os ânimos. Grandes nomes são chamados à luta a partir de consultas simultâneas, daqui e de Pernambuco, ao Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro.

Câmara Cascudo se filia à corrente do Camarão potiguar. Mostra bem sua Acta Diurna de 22 de fevereiro de 1940 – ‘Tradição Popular sobre Felipe Camarão’, citando a pesquisa que publicara na Revista do Instituto Histórico de 1928/29. Na verdade, Pernambuco nunca aceitou recuar, principalmente a partir de 1954, quando José Antônio Gonçalves de Mello, nosso maior estudioso do Brasil Holandês, publicou o ensaio sobre ‘D. Felipe Camarão, capitão dos índios das costas do Brasil’. Bateu o prego e virou a ponta.

Olavo – para não estender a conversa – concluiu na pesquisa que publicou em 1991 que realmente existiram dois Camarões, tio e sobrinho. O velho é o Camarão nascido nestas ribeiras da Capitania do Rio Grande. O novo é o sobrinho, o que lutou na Guerra Holandesa e considerado o herói indígena brasileiro pela Lei 12.701, aprovada agora no Congresso Nacional e sancionada pela presidente Dilma Rousseff que determinou o registro do seu nome no Livro dos Heróis da Pátria. O Camarão herói, pois, não é nosso.

 

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