sábado, 10 de dezembro de 2011

Poesias de FRANCO MARIA JASIELLO em ANATOMIA DA AUSÊNCIA

Prêmio Othoniel Menezes 1984

Edição Bilingue – português / italiano

 ORELHA DO LIVRO:
ANATOMIA DA AUSÊNCIA: uma experiência poética de cópulas e espelhos

             se constituíssemos protocolo de leitura para o livro ANATOMIA DA AUSÊNCIA do poeta Franco Jasiello, diríamos que é preciso penetrar nos espelhos. Nestes defrontamo-nos com a relação bizarra e anômala – que é a maneira própria do poeta dizer o impossível – do “objeto” estético perdido, a Mulher, com o vazio oferecido da palavra. É como se tudo se passasse num imaginário quarto de vestir. Ali realizar-se-iam as cerimônias invisíveis da nudez da mulher, até alcançar o leito vazio da lírica amorosa, da\qual as poéticas radicais analíticas e discursivas da modernidade afastaram-se. Nessa nova obra de Jasiello, o que está em questão é esta descontinuidade, essa ruptura, que faz surgir uma ausência: o enigma da feminilidade. A linguagem jaselliana abre-se, através dos sucessivos cortes imaginários, para o espaço infinito, para o campo do gozo que está ligado ao semblante. A poesia faz-se experiência de cópulas e espelhos. A montagem gramatical equivale a uma sintaxe ávida, erótica. O ato estético mostra-se; o atomesmo do corte que introduz a possibilidade de se falar numa escrita poética dividida por palavras e epor silêncios. Ou, em termos lacanianos, num discurso que é uma estrutura sem palavras. ANATOMIA DA AUSÊNCIA atualiza e manifesta as moções amorosas da poesia lírica, sepultadas e esquecidas. O sujeito poético mira a falta que os espelhos refletem.

            A elaboração criadora do espelho remete à figuração maneirística, que tem nisso sua quintessência (o maneirismo está presente nos séc. XVI, XVII e XVIII). Segundo Gustav Hocke, poetas como Baudelaire, Mallarmé, Paul Valéry, Paul Eluard, EE. Cummings (só para citar alguns nomes da poética da modernidade) encontrar-se-iam entre aqueles que adotam a atitude maneirística em contraponto à clássica. A literatura está sempre fascinada pelos labirintos de espelhos, pelas máscaras, pelo exótico, pelo surpreendente. Neste sentido, Cervantes, Picasso, Borges, Guimarães Rosa são maneirístas. Maneirista será também o homem moderno nas próprias bases culturais da indústria tecnologicizada com suas câmeras e telas, que instituem possibilidades de montar jogos de  espelhos. Goethe considerava a expressão maneirista uma das formas mais elevadas da arte. Com essas identificações autorais, queremos estabelecer laços a partir dos quais a poesia de Franco Jasiello parece articular sua gênese de leitura. Em ANATOMIA DA AUSÊNCIA, o ser espetacular não cessa de se escrever. Lembremos o que disse Leonardo da Vinci: “o espelho é o nosso mestre”. Italiano de origem, homem do maneirismo, de espírito universal, Jasiello não foge a essa maestria. Para devolver à fantasia a sua função reveladora, representa o homem “sonhando sonhos do espelho” (Cummings).



ILZA MATIAS DE SOUZA – Doutora em literatura comparada e professora de Teoria da Literarura.



II PROFUMO



agguato dell'olfatto chimica malizia

aggredisti libri sale braccia e stanze

introduttore intangibili d'assenza

fosti assiduo e incorporeo visitante



sei esame insistente mai ricerca.



II PERFUME



ardil do olfato química malícia

agrediste livros salas braços quartos

intangível introdutor da ausência

foste assíduo incorpóreo visitante



és insistente exame sem procura.



III BRACCIALE



cerchio sonoro striscia luminosa

liturgia evocativa e simulacro

fosti segno di culto restaurato

marchio sigilo reliquia e presagio



sei monile metalico artificio.



III PULSEIRA



aro sonoro réstia luminosa

liturgia evocativa e simulacro

foste lenha de culto restaurado

marca sinete relíquia presságio



és adereço metálico artifício.





IV COLLANA



stagione di miraggi accanto al seno

fosti intrecciato emblema non ferito

sentiero e circuito di sazio contatto

remissione consegna regola e segreto



sei lustro modesto di poco valore



IV COLAR



estação de miragens perto dos seios

foste emblema entrançado sem ferida

senda e circuito de farto contato

remissão entrega guia segredo e regra



és brilho modesto de pouca valia





V SCARPE



cadenza iterativa d'equilibrio

annuncio e ritmo di prossimità

foste insidie soavi compiacenti

sensuali selle barocche vacillanti



siete cuoio ritorto insuperbito



V SANDÁLIAS



cadência iterativa do equilíbrio

prenúncio e ritmo de proximidade

fostes insídias suaves complacentes

sensuais selas barrocas vacilantes



sois empinado couro retorcido.



VII GONNA



austera a volte altre insolente

fosti ritrosia invito e paramento

t'animò il brivido e ti svesti furtivo

morbida eccessiva complice adeguata



sei deforme fagotto abbandonato.



VII SAIA



austera às vezes outras insolente

foste esquiva convite e vestimenta

animou-te o arrepio furtivo e te despiu

macia excessiva cúmplice ajustada



és informe disfarce abandonado.



VIII REGGISENO



penombra d'eclissi progione insegna

coppe d'offerta suggerita e fatta

fosti orbita di stella e di pianeta

lasciasti ansietà non rivelando essenza



sei patetico ornamento bipartito.



VIII SUTIÃ



eclipse penunbral prisão divisa

taças de oferta sugerida e feita

foste órbita de estrela e de planeta

deixaste anseio sem revelar essência



és patético enfeite bipartido.





IX MUTANDINE



caravelle fluviali inconsistenti

foste caligine nebbia crivello

anemome salsuggine ultima posa

meno che ombra piú che chiarore



siete ammuchiato involucro confuso.



IX CALCINHAS



caravelas fluviais inconsistentes

fostes caligem nevoeiro e crivo

anêmonas salsugem último pouso

menos que sombra mais que claridade



sois amassado invólucro disforme.




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