Edição Bilingue – português / italiano
A elaboração criadora do espelho remete à figuração maneirística, que tem nisso sua quintessência (o maneirismo está presente nos séc. XVI, XVII e XVIII). Segundo Gustav Hocke, poetas como Baudelaire, Mallarmé, Paul Valéry, Paul Eluard, EE. Cummings (só para citar alguns nomes da poética da modernidade) encontrar-se-iam entre aqueles que adotam a atitude maneirística em contraponto à clássica. A literatura está sempre fascinada pelos labirintos de espelhos, pelas máscaras, pelo exótico, pelo surpreendente. Neste sentido, Cervantes, Picasso, Borges, Guimarães Rosa são maneirístas. Maneirista será também o homem moderno nas próprias bases culturais da indústria tecnologicizada com suas câmeras e telas, que instituem possibilidades de montar jogos de espelhos. Goethe considerava a expressão maneirista uma das formas mais elevadas da arte. Com essas identificações autorais, queremos estabelecer laços a partir dos quais a poesia de Franco Jasiello parece articular sua gênese de leitura. Em ANATOMIA DA AUSÊNCIA, o ser espetacular não cessa de se escrever. Lembremos o que disse Leonardo da Vinci: “o espelho é o nosso mestre”. Italiano de origem, homem do maneirismo, de espírito universal, Jasiello não foge a essa maestria. Para devolver à fantasia a sua função reveladora, representa o homem “sonhando sonhos do espelho” (Cummings).
ILZA MATIAS DE SOUZA – Doutora em literatura comparada e professora de Teoria da Literarura.
II PROFUMO
agguato dell'olfatto chimica malizia
aggredisti libri sale braccia e stanze
introduttore intangibili d'assenza
fosti assiduo e incorporeo visitante
sei esame insistente mai ricerca.
II PERFUME
ardil do olfato química malícia
agrediste livros salas braços quartos
intangível introdutor da ausência
foste assíduo incorpóreo visitante
és insistente exame sem procura.
III BRACCIALE
cerchio sonoro striscia luminosa
liturgia evocativa e simulacro
fosti segno di culto restaurato
marchio sigilo reliquia e presagio
sei monile metalico artificio.
III PULSEIRA
aro sonoro réstia luminosa
liturgia evocativa e simulacro
foste lenha de culto restaurado
marca sinete relíquia presságio
és adereço metálico artifício.
IV COLLANA
stagione di miraggi accanto al seno
fosti intrecciato emblema non ferito
sentiero e circuito di sazio contatto
remissione consegna regola e segreto
sei lustro modesto di poco valore
IV COLAR
estação de miragens perto dos seios
foste emblema entrançado sem ferida
senda e circuito de farto contato
remissão entrega guia segredo e regra
és brilho modesto de pouca valia
V SCARPE
cadenza iterativa d'equilibrio
annuncio e ritmo di prossimità
foste insidie soavi compiacenti
sensuali selle barocche vacillanti
siete cuoio ritorto insuperbito
V SANDÁLIAS
cadência iterativa do equilíbrio
prenúncio e ritmo de proximidade
fostes insídias suaves complacentes
sensuais selas barrocas vacilantes
sois empinado couro retorcido.
VII GONNA
austera a volte altre insolente
fosti ritrosia invito e paramento
t'animò il brivido e ti svesti furtivo
morbida eccessiva complice adeguata
sei deforme fagotto abbandonato.
VII SAIA
austera às vezes outras insolente
foste esquiva convite e vestimenta
animou-te o arrepio furtivo e te despiu
macia excessiva cúmplice ajustada
és informe disfarce abandonado.
VIII REGGISENO
penombra d'eclissi progione insegna
coppe d'offerta suggerita e fatta
fosti orbita di stella e di pianeta
lasciasti ansietà non rivelando essenza
sei patetico ornamento bipartito.
VIII SUTIÃ
eclipse penunbral prisão divisa
taças de oferta sugerida e feita
foste órbita de estrela e de planeta
deixaste anseio sem revelar essência
és patético enfeite bipartido.
IX MUTANDINE
caravelle fluviali inconsistenti
foste caligine nebbia crivello
anemome salsuggine ultima posa
meno che ombra piú che chiarore
siete ammuchiato involucro confuso.
IX CALCINHAS
caravelas fluviais inconsistentes
fostes caligem nevoeiro e crivo
anêmonas salsugem último pouso
menos que sombra mais que claridade
sois amassado invólucro disforme.
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