Não,
Senhor Redator, não é sobre a nova edição de Claro Enigma, o livro de poemas
que forma, ao lado de Rosa do Povo, os títulos mais clássicos do poeta Carlos
Drummond de Andrade, agora forrado por um belo posfácio de Antônio Carlos
Secchin. É do governo, assunto mais banal e íntimo deste que tem sido um espaço
de banalidades da vida. Quem ouve a governadora Rosalba Ciarlini no rádio todas
as manhãs, e é o que costumo fazer, fica impressionado com a bela pujança do
outro Rio Grande do Norte.
Digo
o outro, pois é naquele do rádio que qualquer norte-rio-grandense gostaria de
morar. Não sei se é invenção do marketing, embora não duvide de suas danações.
Sei que tem estradas em construção, as escolas reformadas, os hospitais
ampliados, agricultura, leite e remédios. E talvez por isso, por esse futuro
tão promissor, vá nascendo num ouvinte desavisado como este cronista a sensação
de que caiu sobre essa Natal o manto espesso do abandono. Só pode. Aqui tem
tudo quanto sobra nas ondas da palavra oficial.
É
ai que a retórica do governo encontra seu obstáculo mais difícil. Talvez tão
firme quanto a pedra do poema drummondiano. Não aquela outra, mais antiga, de
Nel mezzo del camin, do soneto bilaquiano, do cheguei, chegastes, vinhas
fatigada e triste, de raízes plantadas em A Divina Comédia, de Dante. Fico
apenas no poema ousado de Drummond, fechando o caminho, ferindo as retinas tão
fatigadas, que o governo de Rosalba é muito moderno demais para tropeçar em
velhas figuras de estilo tão parnasianas.
Pois
eis que há outro Rio Grande do Norte que não é este hoje refletido nas páginas
dos jornais e nas telas da tevê desse povo besta daqui. Um governo atuante e
capaz que mesmo tomando emprestada a bagatela de pouco mais de quatrocentos
milhões de reais, aceitou pagar em vinte anos, cinco governos, e arredondando
para um bilhão e duzentos reais. O que se entende, afinal não se deve negar o
pão e o circo à fome de alegria do povo, mas não precisava chamar legado da
copa o que se vai pagar com tantos juros.
Não
sou contra a Copa, Senhor Redator. E se fosse até seria humanamente
compreensível a dura e terrível frustração de um gordo e por isso incapaz de
uma escapada pelas pontas e o chute a gol a erguer, sobre a pobre vaidade
humana, o clamor das torcidas. Mas é que a Copa nos tem sido vendida como um
elixir, um cataplasma, um ungüento milagroso. Mais do que uma ingênua e
decorativa figura de estilo que adorna o soneto de Bilac, o legado é como se
fosse a terra prometida a que se chegará levados por Deus.
Ora,
ora, Senhor Redator, deve ser defeito de alma a mania de desconfiar das
retóricas banhadas de ouro. Desse brilho de diamante falso a fascinar o olhar.
Tenho pra mim, a mexer com as minhas teclas e meus botões, que a desinformação
é a nova forma de barbárie. Não no sentido das coisas simplesmente bárbaras.
Seria um reducionismo perigoso, um olhar simplório demais para não dizer
inculto. Estamos diante de algo mais complexo. Talvez da ruína e não do
rudimento. Como ensinou Joseph de Maistre
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