quarta-feira, 11 de julho de 2012

SEREJO: A casa de Robin Hood


Por: Vicente Serejo

Nunca faltam sonhos, Senhor Redator, à pobreza de alguns. Lembro que uma vez, numa de suas crônicas mais líricas, vi Berilo Wanderley lamentar com tristeza não ter fortuna para comprar uma ilha exposta à venda. Dizia ele, que a notícia saltou do jornal e caiu bem na alma. Como também não teria como comprar uma ilha, passei a invejar seu sonho. Por isso, às vezes, ando pelo mundo. E invento ser dono de ilhas e castelos só para não deixar de nascer em mim um pouco de glória, mesmo de mentira.

Foi assim outro dia quando dei com os olhos num anúncio publicado pela Isto É, edição do dia 20 de julho. Estava lá, página 27: ‘Casa de Robin Hood vai à venda por R$ 22 milhões’. Fiquei olhando o anúncio e foi nascendo no chão da alma uma imensa frustração. O que significaria para um milionário uns míseros 22 milhões de reais para ter a casa onde o lendário Robin Hood viveu os seus últimos dias, construída no ano de 1135, que foi mosteiro e abrigou o silêncio de seus monges até o século dezesseis?

É verdade que não poderia comprá-la diretamente ao proprietário, mantido em sigilo, porque vai ser vendida em leilão. Mas, sendo um anônimo, nativo dessas ribeiras daqui, quem daria importância a um desconhecido que por acaso desse o primeiro lance superior as 22 milhões de reais e arrematasse a casa de Robin Hood? No máximo, e se muito, uma notinha de pé de página. E aqui, talvez por inveja, se é que há invejosos aqui. Ou um resmungo, um desdenhoso dar de ombros. Talvez um muxoxo, se tanto.

Cito Le Goff por ser dele o único livro que tenho aqui sobre esses heróis medievais. É um herói que viveu como personagem nas baladas dos séculos treze a quinze, mas não se sabe se foi de carne e osso. Sua lenda, e basta a lenda, já o eterniza como símbolo do bem contra o mal, roubando dos ricos para dar aos pobres. Para Le Goff, sua história se assemelha à história de Shakespeare sobre um herói que se refugiou na Floresta de Arden, depois de ‘desapossado de suas terras e de funções por seu irmão’.

Le Goff também reconhece que o pai do Robin Hood moderno é Walter Scott que o faz renascer no romance Ivanhoé. Robin usa o nome de Locksley e salva o Rei, preso por um irmão ao chegar das Cruzadas. Esta sua ardente aventura, nascida da imaginação de Scott, o faz libertar o rei Ricardo Coração de Leão. Ao revelar seu verdadeiro nome – Robin Hood – a Ricardo, este o perdoa como o rei de verdade e o absolve dos seus roubos – ‘Nada do que hás podido fazer jamais será usado contra ti’.

Não importa se seu nome também é lendário e nasceu do seu chapéu adornado com penas das aves da floresta de Sherwood, em Nottinghamshire. Importa a sua luta contra o xerife de Nottingham, ‘símbolo do poder político e social, impiedoso e impopular’. Com seu arco, observa Le Goff, que o torna um arqueiro, a sua única nobreza vem do povo pelo qual luta na sua história até hoje lendária para uns e verdadeira para outros. Não foi à toa que Eric Hobsbawm o viu como um modelo de anti-herói.

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