Há
os que cantam a fortuna, o poder, a glória. E há os outros, os imprestáveis
para a vida que só sonham saber contar uma grande história de amor. Sem valor
nenhum, que fosse. Mas uma história que ninguém tivesse contado antes. E que
talvez começasse como aquela história que a atriz Carolina Ferraz começou a
contar outro dia, mas interrompeu. Agora ninguém nunca vai saber o fim. De um
grande amor que um dia chegou suave. Cruzou a sua vida. Tocou a sua pele.
Marcou a sua alma. E nunca mais voltou.
Não
é que isso de não saber um segredo de amor roube a alegria de viver. Mas é que
dito assim, envolvido num certo mistério, é como se o dito escondesse o não
dito para cair na alma como se fosse a última grande história de amor. Só os
desvalidos, pobres de riqueza, contam nos próprios dedos a pobreza de não ter
sido um belo aventureiro das legiões estrangeiras. Como aquele moço, coronel
das Índias, de quem um dia Dalton Trevisan imaginou fazer nascer, das mãos
frágeis de Katherine Mansfield, petúnias.
Não
faz muito tempo li numa dessas revistas que tratam da vida que um pobre homem
muito rico e muito infeliz, só podia receber cartas de amor na sua
posta-restante. Todas as semanas saia sozinho até o correio e de lá trazia, sob
sigilo postal, uma carta de amor que ele guardava, como um segredo, entre as
páginas dos muitos romances de amor da sua vasta biblioteca. Escondia nos
livros, sem marcá-los. Como se fossem os capítulos de uma história que preferia
escrever sem escrever. Feita de confissões proibidas.
Ora,
Senhor Redator, como seria bom ser o bibliotecário naquela casa e todo dia
arrumar aqueles livros. Não apenas para vê-los limpos, prisioneiros dos seus
dorsos enfileirados, como se fossem caixas de segredos silenciosos que iam se
revelando ao acaso, sem ordem, sem numeração. Uma história sempre incompleta,
inacabada. Como, aliás, deveriam ser as grandes histórias se o amor é também
assim, feito de pedaços que se encontram, se completam, e depois, tão
desencontrados, reinventam começos sem fim.
Tenho
pra mim que as histórias e os poemas de amor guardam entre suas linhas e versos
muitas leituras. São pequenas aventuras espreitando os olhos dos leitores. Um
encontro mágico, abrindo o olhar humano em veredas numa floresta encantada.
Quando li Moby Dick só vi a baleia a perseguir o sonho do capitão Ahab. Um dia,
muitos anos depois, lendo Carlos Heitor Cony, de repente a baleia branca se
ergueu diante de mim como a busca de um destino e só então compreendi o
absoluto, o sinal de Deus.
Talvez
Herman Melville na sua longa contemplação do mar, entre tristes e grandes
silêncios de espera, tenha contado ao mundo uma história profundamente humana e
que só se revela a quem joga os olhos do outro lado da baleia branca. No vazio
do seu mar sem nada, onde nascem os sinais do absoluto e do infinito, como
escreve Cony. Ali está a história de uma derrota humana que humaniza seus
leitores. Mas só aqueles que sobrevivem à morte do capitão Ahab descobrem que
sua única riqueza era sonhar
Nenhum comentário:
Postar um comentário