sábado, 7 de julho de 2012

Por uma história de amor

Por: Vicente Serejo

 Há os que cantam a fortuna, o poder, a glória. E há os outros, os imprestáveis para a vida que só sonham saber contar uma grande história de amor. Sem valor nenhum, que fosse. Mas uma história que ninguém tivesse contado antes. E que talvez começasse como aquela história que a atriz Carolina Ferraz começou a contar outro dia, mas interrompeu. Agora ninguém nunca vai saber o fim. De um grande amor que um dia chegou suave. Cruzou a sua vida. Tocou a sua pele. Marcou a sua alma. E nunca mais voltou.

 Não é que isso de não saber um segredo de amor roube a alegria de viver. Mas é que dito assim, envolvido num certo mistério, é como se o dito escondesse o não dito para cair na alma como se fosse a última grande história de amor. Só os desvalidos, pobres de riqueza, contam nos próprios dedos a pobreza de não ter sido um belo aventureiro das legiões estrangeiras. Como aquele moço, coronel das Índias, de quem um dia Dalton Trevisan imaginou fazer nascer, das mãos frágeis de Katherine Mansfield, petúnias.

 Não faz muito tempo li numa dessas revistas que tratam da vida que um pobre homem muito rico e muito infeliz, só podia receber cartas de amor na sua posta-restante. Todas as semanas saia sozinho até o correio e de lá trazia, sob sigilo postal, uma carta de amor que ele guardava, como um segredo, entre as páginas dos muitos romances de amor da sua vasta biblioteca. Escondia nos livros, sem marcá-los. Como se fossem os capítulos de uma história que preferia escrever sem escrever. Feita de confissões proibidas.

 Ora, Senhor Redator, como seria bom ser o bibliotecário naquela casa e todo dia arrumar aqueles livros. Não apenas para vê-los limpos, prisioneiros dos seus dorsos enfileirados, como se fossem caixas de segredos silenciosos que iam se revelando ao acaso, sem ordem, sem numeração. Uma história sempre incompleta, inacabada. Como, aliás, deveriam ser as grandes histórias se o amor é também assim, feito de pedaços que se encontram, se completam, e depois, tão desencontrados, reinventam começos sem fim.

 Tenho pra mim que as histórias e os poemas de amor guardam entre suas linhas e versos muitas leituras. São pequenas aventuras espreitando os olhos dos leitores. Um encontro mágico, abrindo o olhar humano em veredas numa floresta encantada. Quando li Moby Dick só vi a baleia a perseguir o sonho do capitão Ahab. Um dia, muitos anos depois, lendo Carlos Heitor Cony, de repente a baleia branca se ergueu diante de mim como a busca de um destino e só então compreendi o absoluto, o sinal de Deus.

 Talvez Herman Melville na sua longa contemplação do mar, entre tristes e grandes silêncios de espera, tenha contado ao mundo uma história profundamente humana e que só se revela a quem joga os olhos do outro lado da baleia branca. No vazio do seu mar sem nada, onde nascem os sinais do absoluto e do infinito, como escreve Cony. Ali está a história de uma derrota humana que humaniza seus leitores. Mas só aqueles que sobrevivem à morte do capitão Ahab descobrem que sua única riqueza era sonhar

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