Albino
Rodrigues Alvarez
Nosso
modo de produção e consumo conduz à produção crescente de resíduos de todo o
tipo, que contaminam o ambiente, propiciam a propagação de enfermidades,
degradando o próprio convívio social. A sociedade humana tem se fundamentado,
crescentemente, num sistema que conduz a grandes desperdícios. E com a elevação
do padrão de renda, pelo menos no início, a tendência é de agravamento dessa
situação.
A
grande novidade no Brasil nesse setor, sob o aspecto institucional, foi a
promulgação da lei 12.305/2010 que, após 20 anos de tramitação, institui a
Política Nacional de Resíduos Sólidos. Regulamentada em 2010 pelo decreto 7.404
ela prevê a elaboração do Plano Nacional de Resíduos Sólidos, e de planos estaduais,
intermunicipais e municipais, gerando um arcabouço institucional a orientar as
ações dos gestores, pré-requisito inclusive para a liberação de recursos. O
Plano Nacional deve ser apresentado em breve, e os demais devem ter a sua
elaboração iniciada ainda este ano.
Como
linha mestra da Política Nacional pode-se apresentar uma visão ampla do
problema. Não se resume a uma política para resíduos domésticos, mas para todo
tipo de resíduos, industriais, de serviços de saúde, da construção civil, do
setor de transportes, agrosilvopastoris, da mineração, perigosos ou não. As
diretrizes, estratégias e metas focam em disposição adequada, redução da
produção de resíduos, reciclagem e sustentabilidade dos resultados ao longo dos
20 anos de duração do plano inicial, com avaliações periódicas. O envolvimento
e a responsabilização de gestores, produtores e consumidores plasmam-se no
conceito de logística reversa, pelo qual a responsabilidade dos produtores de
mercadorias se estende a etapas pós-consumo. Aspectos como o desenvolvimento de
instrumentos econômicos de incentivo e a educação ambiental estão contemplados,
bem como a promoção social de catadores organizados.
O
Ipea pôde participar, ao longo de 2011, da elaboração do plano, a convite do
Ministério do Meio Ambiente, produzindo diagnósticos setoriais que serviram de
base para as discussões, que culminaram com as audiências públicas já
realizadas. Diversos grupos socioeconômicos puderam intervir com sugestões de
aperfeiçoamento para as estratégias e metas apresentadas.
Como
primeira grande conclusão dos estudos, percebe-se que a coleta avançou muito no
país nos últimos vinte anos. Hoje ela é quase universal (98%) na área urbana
mas mostra ainda uma lacuna de mais de 50% na área rural. O desafio imediato é
melhorar a qualidade do serviço e atacar o problema da disposição final
adequada do lixo.
A
coleta seletiva ainda é incipiente no país. Existem muitos serviços planejados,
mas que em extensão não são significativos. Se alguma reciclagem há, atingindo
50% do consumo no setor de papel e papelão, um terço a 40% do alumínio e aço,
20% do plástico e vidro, esta se deve sobretudo à ação de catadores autônomos e
à reciclagem pré-consumo (resíduos dos processos produtivos). A compostagem dos
resíduos orgânicos é irrelevante em termos globais (1% do coletado).
No
que toca à disposição dos resíduos, os lixões estão presentes em 50% dos
municípios brasileiros. A ideia é substituí-los por aterros sanitários
adequados. A distribuição regional é muito desigual. Cerca de 90% dos
municípios nordestinos apresentam lixões, contra 15% na região Sul. Essa
dicotomia é marcante, opondo o Sul e o Sudeste, com indicadores mais
favoráveis, ao resto do país. Os pequenos municípios também estão em má
situação, tanto pior quanto menor o seu tamanho.
Setores
como serviços de saúde, indústria e construção civil apresentam legislação
abundante, frequentemente não cumprida quanto à disposição adequada. Já no
setor agrosilvopastoril e na mineração, a questão é relativamente nova e falta
informação de qualidade. Cada setor necessita ser tratado na sua
particularidade e nas suas condições objetivas. Em algumas áreas cumprir a lei,
em outras acumular conhecimento.
O
desafio imediato é a elaboração dos planos municipais e, em especial dos
intermunicipais. Aterros não são viáveis, por questão de escala, em municípios
pequenos e mesmo médios. E, cabe lembrar, o horizonte de um aterro mal gerido é
reverter à condição de lixão. A meta mais emblemática prevista em lei, é a
eliminação dos lixões até agosto de 2014. Dado o exposto, a dimensão do
problema quantitativo e qualitativo, um desafio da política de resíduos sólidos
será perdurar em sua ação, a despeito de uma eventual impossibilidade física de
cumprimento desse dispositivo legal. O desafio do lixo é permanente. Não
podemos correr o risco de perder o bom trabalho desse último biênio. Essa é uma
questão que veio para ficar.
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Albino
Rodrigues Alvarez é técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoriade Estudos
Regionais, Urbanos e Ambientais (Dirur) do Ipea.
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