segunda-feira, 4 de junho de 2012

SEREJO: O exílio de Palumbo

 Por: Vicente Serejo

Outro dia, não faz muito tempo, andei reclamando aqui dos antigos feriados que encontrei num velho Almanaque de Lembranças, de 1929, e que há anos cochila nas prateleiras deste pequeno armazém de livros velhos e de ocasião. Figuras e datas abandonadas por esta cidade sem memória que esquece seu próprio passado nas gavetas empoeiradas dos arquivos. Menos de uma semana depois, fui encontrar nas páginas deste JH o artigo de Ormuz Barbalho Simonetti sobre o exílio do arquiteto Giácomo Palumbo.

Digo exílio, Senhor Redator, para não ser indelicado com os viventes daquela ruela. Também moro numa rua assim, pequena e estreita, mas não há nada em mim que justifique uma avenida. Já com Palumbo aquela ruela próxima ao cruzamento da Presidente Bandeira com São José, é um exílio do seu Plano de Sistematização. Nem um lugar em Tirol ou Petrópolis a cidade encontrou para homenageá-lo com dignidade. Tem apenas seu nome numa placa de rua onde ninguém sabe quem ele é e nem o que fez.

Não preciso lembrar sua história toda contada que foi por Ormuz Barbalho Simonetti, mas destaco um detalhe que ele ressaltou e que fixa com todos os traços e cores o retrato trágico de uma cidade ainda tão desmemoriada. Conta nosso historiador dos iluminados verões de Pipa que um dia, no ano da graça de 1972, o chefe do arquivo geral da Prefeitura, certamente aborrecido com tanto papel velho, fez ofício ao então secretário do planejamento solicitando permissão para incinerar o que julgava imprestável e inútil.

Contam que veio a resposta concordando, e assim foi feito. Imagino as chamas devorando tudo, os processos, mapas, fotografias, certidões e relatórios. Era a própria história da cidade crepitando nos olhos do burocrata ordeiro e exemplar. Nada restou, a não ser um arquivo limpo e varrido, inútil por não saber contar, com documentos históricos, a evolução urbana da cidade. E de Palumbo, a placa numa rua longe do mundo que ele criou, sem inscrição nenhuma. Num exílio injusto, sem glória e sem consagração.

 Foi assim com o sítio histórico da Rampa, hoje partido ao meio, para no seu chão histórico agora se erguer uma construção modernosa, a sede do III Distrito Naval. E como se já não bastassem as grandes áreas militares que cercam o perímetro urbano da cidade. A então governadora Wilma de Faria consentiu sob o silêncio da Fundação José Augusto, alegando que a representação local do Patrimônio Histórico tombou apenas a sede da Rampa, na sua clara demonstração de insensibilidade e, mais que isto, incultura.

  Tem razão Ormuz Barbalho Simonetti quando protesta diante do espaço que a cidade reservou a um dos planejadores do seu desenvolvimento urbano. Não tem uma herma, uma estátua, um monumento, um pequeno jardim, uma rua, uma avenida, nada. Pior: a área de Tirol e Petrópolis sequer foi tombada. Seus canteiros largos estão sendo rasgados para estacionamentos. E ali na Afonso Perna com a Jundiaí um gênio inventou a bestialidade de um contra-fluxo, sinal perfeito da mentalidade modernosa que nos cerca.

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