Reflexão em três atos. Fome, violência e abuso sexual foram os temas representados pelos atores em cena
Imagine-se
na feira, fazendo suas habituais compras de domingo, ou comendo um pastel, ou
ainda uma tapioca, e ser surpreendido por um grupo de pessoas que ligam uma
pequena caixa de som e começam a construir cenas teatrais. Imaginou? Pois foi isso o que aconteceu no
domingo, 29 de abril, por volta das 8 horas da manhã. O Grupo de Teatro
Wankabuki, estendendo as atividades realizadas na IV Oficina de Teatro Cena
Aberta, resolveu intervir em ambientes com grande movimentação de pessoas para
mostrar um pouco do trabalho desenvolvido em sala de aula. Na ocasião, doze
atores, divididos em três grupos, construíram cenas de acordo com temáticas
pré-estabelecidas: fome, violência e abuso sexual.
Para
a confecção das cenas foi utilizada a Teoria do Oprimido, desenvolvida pelo
teatrólogo brasileiro Augusto Boal, durante a década de 60, em plena Ditadura
Militar. Dentro da proposta apresentada por Boal, foi adotado o jogo das massas
de modelar, em que três dos atores de cada grupo ficavam inertes, enquanto o
quarto ia moldando-os, conforme a cena desejada e que foi ensaiada durante a
oficina. Apresentaram-se os artistas: Daniela Gonçalves, Danielle Bezerra da
Silva, Dennis Weber, Elieldo Alves Paes, Herbert Weil, Isabela Tabalipa, Mayko
Estefano, Rafael Reis, Rutileia Barbosa, Shely Lisboa, Stefhani Wolf e Valdete
Sousa.
O
resultado das intervenções realizadas na Feira Municipal do centro (no período
matutino) e no Park Shopping Vilhena (no período noturno) foi positivo, segundo
a presidente do Grupo de Teatro Wankabuki, Valdete Sousa. “Os atores em cena,
alguns estreantes, reagiram bem à atividade. Ocorre muito nervosismo nas
primeiras apresentações, e a consequência disso pode ser o esquecimento dos
movimentos, no entanto, isso não aconteceu. Todos se saíram muito bem”,
ressaltou.
Segundo
Valdete, as intervenções realizadas pelo grupo têm caráter marginal. “Nós não
trabalhamos por dinheiro. Fazemos arte pela arte. É claro que precisamos de um
mínimo de recurso para poder montar uma apresentação, mas mesmo assim não temos
atrelamentos com empresas. Isso faz com nossas intervenções, como essas que
ocorreram, sejam livres, momentos em que podemos fazer denúncias através do
teatro. E o caráter dessas denúncias já é explicitado no cotidiano das pessoas,
quando elas assistem a uma novela, por exemplo, onde são mostradas cenas de
violência, e às vezes, até de abuso sexual. Nós só reforçamos esses assuntos,
claro que com uma proximidade muito maior do espectador, por que estamos no
mesmo ambiente que ele”, explicou.
Quanto
à reação do público presente Valdete disse ser possível qualquer coisa. “O que
a gente percebeu foi muita dúvida por parte das pessoas que passavam pelos
ambientes. A maioria parava e olhava, e que acredito que se perguntava o que
era aquilo. Mas ninguém atacou a gente”, explicou rindo. “Esse tipo de
atividade cênica é imprevisível. Todos que estão no local acabam se envolvendo
de alguma forma. Acredito que na feira tivemos maior dificuldade, por ser um
ambiente mais aberto, com pessoas gritando, outras buzinando para chamar a
atenção para seus produtos e outras ainda trombando nos atores que estavam nos
locais de maior fluxo de transeuntes. Muitos pararam, e ficaram realmente
interessados naquilo que estava sendo exposto”, descreve.
Park Shopping Vilhena
Agora
imagine-se no Park Shopping Vilhena, degustando um cappucino, um chopp ou
qualquer outra coisa e de repente o som ambiente que, até então era dominado
pelo sertanejo, é modificado e, irrompem dos alto-falantes as interpretações
venais de Edith Piaf. Em seguida um grupo de indivíduos, todos vestidos de
preto, entram e começam a criar cenas temáticas, sem pronunciar uma palavra
sequer. Essa foi a segunda intervenção realizada pelo Grupo de Teatro
Wankabuki, no domingo, 29 de abril. O horário escolhido pela trupe foi o
noturno, e em ambiente fechado, executaram os movimentos realizados pela manhã,
na feira municipal.
“O
espaço do shopping é diferente. Porque não há tanto barulho quanto na feira.
Todos estão sentados, degustando suas bebidas e comidas, mas quando veem uma
movimentação fora do habitual, já ficam sobressaltados. Assim que entramos em
cena, notamos o silêncio que aquela plateia fazia. No final aplaudiram a nossa
apresentação”, disse Valdete.
Os atores
A
concentração era o fator principal cobrado dos artistas em cena. “Achei que não
conseguiria me apresentar, principalmente no shopping, onde muitas pessoas
conhecidas estavam presentes. Mas o foco na atividade, fez com esquecesse por
um momento que estava sendo observada, e assim pude realizar a atividade com
desenvoltura”, relatou a universitária Daniela Gonçalves de Souza, 18,
integrante do grupo há um ano.
Para
o assistente social Rafael Reis, 25, que está no grupo há dois anos, a
atividade foi impactante. “Não sabíamos a reação do público, então estávamos
preparados para tudo. Achei que nem iríamos receber atenção das pessoas que
estavam passando, mas não foi isso o que aconteceu. Muita gente parou para ver
e no final aplaudiu”, descreveu.
O
resultado da intervenção foi ótimo, segundo a estudante Isabela Tabalipa, 16,
atriz no grupo há dois anos. “Achei muito legal a curiosidade com que as
pessoas olhavam pra gente, ainda mais em uma situação não prevista por elas.
Penso que elas acham que a gente seja um bando de loucos. E não estão
totalmente erradas, né,” disse sorrindo.
Estreia
O
nervosismo foi o grande obstáculo para aqueles que estavam iniciando nas artes
cênicas, como apontou o estreante Elieldo Alves Paes, 22 anos. “Estava mais
calmo na apresentação da manhã, mas quando soube que apresentaríamos aqui no
shopping fiquei um pouco nervoso, mas depois da metade da apresentação conseguir
ficar calmo”, narrou.
Frio
na barriga também sentiu a universitária Danielle Bezerra da Silva, 22 anos.
“Na apresentação da feira nem abri os olhos de tão nervosa que estava. Já na
intervenção do shopping estava mais calma, mesmo com um monte de gente olhando
pra mim, consegui abrir os olhos”, contou.
Foco
foi a arma utilizada pelo locutor e produtor, Mayko Estefano, durante a
performance. Acostumado com os bastidores do teatro, onde executa as funções de
iluminador e sonoplasta, o acadêmico de Administração encarou a plateia pela
primeira vez. “Mantive a concentração na atividade. Sabia que estava rodeado de
pessoas, mas tinha um objetivo e acabei por cumpri-lo, sempre com uma sensação
de tranquilidade me acompanhando”, falou.
Para
o jornalista Herbert Weil, estrear com intervenções em espaços públicos e
privados foi desafiador. “Isso porque o público foi escolhido pela gente, e não
ao contrário, como é comum de acontecer. Então você fica ansioso, pensando o
que pode acontecer durante a apresentação. Mas a atividade superou minhas
expectativas. De um modo geral, achei muito pertinente a proposta da intervenção,
de ter esse tom de denúncia. As performances que realizamos tiveram como
objetivo mostrar que problemas existem, e que a gente deve parar para pensar
neles e procurar uma solução”, descreveu.
TEXTO:
ASSESSORIA
FOTOS:
NAYARA PECINATO
Nenhum comentário:
Postar um comentário