Ao final de seu mandato, Sarkozy terá suprimido 80
mil postos de trabalho na educação pública francesa. O chefe de Estado pretende
impor uma ruptura na avaliação dos professores secundários com o objetivo de
submeter os educadores aos chefes de estabelecimentos de ensino, seus
"empregadores"
É preciso um patrão nos estabelecimentos de
ensino”, clamava o ministro da Educação francês, Luc Chatel, em 7 de dezembro
de 2011 na rádio France Inter. Ele resumia assim o espírito das novas
modalidades de avaliação dos professores, anunciadas um mês antes e que deverão
entrar em vigor em setembro de 2012.
Atualmente, os professores do ensino médio recebem
duas notas: uma, administrativa, atribuída todo ano pelo diretor do
estabelecimento em função de uma tabela nacional; a outra, pedagógica,
estabelecida pelo inspetor da disciplina durante uma visita de classe,
realizada a cada três a dez anos. A combinação das duas avaliações resulta em
uma nota final que determina a progressão das carreiras e das remunerações.
Para as evoluções mais lentas, o avanço depende exclusivamente do tempo de
serviço: um nível a cada 3,5 anos, por exemplo, a partir do quinto nível (que
engloba cerca de 50% dos professores).1 Para os mais rápidos,
conhecidos por “grande seleção” (30% dos professores), a progressão se efetua
no ritmo de um nível a cada 2,5 anos (sempre a partir do quinto nível).
Hierarquia adicional
Nesse sistema, inaugurado em 1950 e revisado em
1989, o ministro Luc Chatel deseja incluir duas modificações. A primeira faz a
promoção das carreiras basear-se apenas no tempo de serviço, ou seja, traz uma
forte desaceleração da progressão dos salários para a maioria dos professores:
a medida significaria o mesmo que prolongar a carreira completa em seis anos
(uma evolução que deveria refletir o alongamento das carreiras em consequência
da reforma das regras das aposentadorias de 2010). A segunda emenda prevê a
eliminação da nota pedagógica: a avaliação dependeria totalmente de uma entrevista
trienal com o diretor do estabelecimento de ensino (o empregador direto), o
qual poderia efetuar reduções no tempo de serviço de dois ou cinco meses em
função dos méritos do “funcionário”.
Alguns se surpreendem com os esforços do ministro
Chatel para diminuir um pouco mais a remuneração dos professores, enquanto um
relatório da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico
(OCDE), publicado em outubro de 2010,2 salienta o baixo valor
das remunerações: ela é em média 20% inferior à do conjunto dos países-membros
da organização. Em 28 de fevereiro, Nicolas Sarkozy propôs aumentar o salário
dos professores do ensino fundamental (do 5º ano ao 8º ano) em 25%, com a
condição de que fizessem a partir de então 26 horas de “presença” em seus estabelecimentos,
contra as 18 horas atuais, segundo o candidato da União por um Movimento
Popular (UMP). Essa última cifra só corresponde, no entanto, às horas de aula e
ignora o trabalho de preparação, correção, as reuniões obrigatórias (conselhos
de classe, reunião de pais) ou informais etc. Segundo o Sindicato Nacional dos
Professores do Segundo Grau (SNES), o tempo de trabalho real dos professores
chega atualmente a 40 horas semanais.
O governo havia em um primeiro momento anunciado um
aumento da remuneração de início de carreira: generosos 200 euros a mais para
alguns milhares de professores justificaria então, segundo ele, o corte de
alguns milhares de euros para todos no conjunto da categoria.3
Nada melhor para dividir os funcionários.
A evolução “administrativa” que as medidas
anunciadas refletem prolonga o projeto geral da Nova Gestão Pública (NPM, sigla
em francês), que visa regular a atividade dos funcionários públicos por meio de
objetivos (aqui, o êxito dos alunos, por exemplo) e regras estatutárias.4
A NPM vem acompanhada ao mesmo tempo de uma autonomização crescente dos
estabelecimentos – justificada por um discurso de “liberdade” – e de um
acréscimo de supervisão, e portanto de hierarquia. Assim, satisfaz menos aos
empregados submetidos a esse novo controle social que aos quadros dirigentes,
em quem ele se apoia, sem que estes últimos percebam como eles próprios se
encontram enredados por princípios pelos quais são responsáveis.
“Bom” ou “belo” trabalho?
Entretanto, avaliar um professor implica distinguir
as normas do “belo trabalho” e do “bom trabalho”. A comunidade profissional
avalia em geral a primeira tendo por base seus ideais profissionais e
organizacionais; o reconhecimento por seus pares se revela fundamental. O bom
trabalho se apoia em uma norma institucional, em uma concepção normativa
formulada pelo empregador. Toda atividade se vê então continuamente dividida em
sua avaliação entre o trabalho imposto, bem próximo ao bom trabalho, e o
trabalho real, bem próximo ao belo trabalho.
Querer sobrepor o trabalho imposto em relação ao
trabalho real – a ambição final das lógicas administrativas – depende,
portanto, de uma forma de taylorização, sentida como violenta pelos
trabalhadores. Não é mais a própria atividade que é levada em conta, mas unicamente
seus resultados, sua “renda visível”. A avaliação se dirige para o que não é
objeto direto da atividade: os sinais tangíveis e aparentes da submissão aos
objetivos definidos pela instituição.
Assim, uma grade de entrevistas utilizada hoje na
academia “piloto” de Dijon propõe avaliar a capacidade dos professores para
“entregar documentos solicitados no momento desejado, aplicar as regras
coletivas referentes às sanções e punições, respeitar a hierarquia, participar
do conselho de administração ou do conselho pedagógico, preencher a agenda de
classe”.
Mais alunos, mais aprendizagens, conhecimentos e
pedagogia: somente permanece a avaliação dos contornos da tarefa profissional.
E como a avaliação acaba por comandar a atividade, só restará aos professores
produzir as provas artificiais de sua excelência, que são geralmente sinais de
sua submissão às injunções da autoridade.
Christophe Hélou
Autor, com Françoise Lanthéaume, de La
Souffrance des enseignant: Une sociologie pragmatique du travail enseignant (O
mal estar dos professores: uma sociologia pragmática do trabalho docente),
Presses Universitaires de France, Paris, 2008
Nenhum comentário:
Postar um comentário