terça-feira, 10 de abril de 2012

" A lei e o vício"

 Por Vicente Serejo, Jornalista, cronista, professor universitário. Natal, RN

Jovem, desejei ser advogado incentivado pelo exemplo de um tio desembargador, vítima de uma bala acidental que lhe tirou a vida aos 43 anos. Veio a consciência, antes de terminar o primeiro ano, e avisou ao futuro bacharel que seria desastroso tentar insistir. Livrei o fórum de suportar um advogado medíocre e aceitei a inclinação para este ofício menor de escrever notícias e crônicas. Desde aquele tempo tenho medo do legalismo, monstro enlouquecido que nasce e vive nas entranhas da lei.
Até hoje, quando vou esquecendo, vem outro exemplo e espeta a consciência. Como agora, no julgamento dos políticos fichas suja. O Supremo Tribunal Federal não ousou para decidir ouvindo a voz rouca das ruas, como se diz na clicheria política. Ficou no limite estrito da lei como esta fosse maior do que o Direito e longe do clamor popular. E os fichas sujas vão assumir seus mandatos do quatro ou oito anos, de deputado ou senador, debaixo dos bigodes acabrunhados da opinião pública brasileira.
E a lei, Senhor Redator, alegam os que fazem o império da norma. A nós outros e aos próprios ministros que sabem da sujeira daquelas fichas, nada mais há a fazer. O Supremo é o Supremo. Depois dele, nestas terras da Ilha de Santa Cruz, só Deus. E Deus, até onde se sabe, é um ser acima das questiúnculas políticas e dos queixumes da politicagem. Que se cumpra, pois, a vontade da Corte. Aliás, é bem próprio do gosto monarquista que nunca nos abandonou, mesmo depois da República.
Não chego a repetir o jargão daqueles que afirmam ser o politico alguém que não teme e não para na fronteira do pudor. Seria muito. Mas, entre perder o mandato ou a compostura, e isto é um fato, joga fora os dedos e fica com os anéis. É com eles - e o político pensa assim - que terá acesso à riqueza do poder que nem sempre precisa ser feita de ouro ou níquel, mas do brilho na lapela, lugar que a convenção social escolheu para exibir os dísticos da glória política a quem, desavisado, não souber.
A sujeira, portanto, é legal. Pelo menos até 2012, nas eleições municipais. Ninguém sabe se essa legalidade não sobrevive até 2014. Até lá, certamente teremos outras mãos sujas, mas também teremos governadores sonhando com a renovação de seus mandatos e uma vaga de senador para cada estado. O caldo grosso do poder, então, será mexido na fervura das ambições e dos desejos e só então se saberá se teremos nova interpretação capaz de vencer o determinismo brasileiro para a impunidade.
Ainda não foi desta vez que o sol forte da opinião pública, como dizem os franceses, iluminou nossos juízes supremos. Não se duvida de suas auras feitas de um saber jurídico sólido e incontestável. Nem da boa fé de suas almas.
Mas é difícil compreender que a norma constitucional venha resguardar a impunidade. No meu caso, Senhor Redator, devo confessar, é mais difícil: além de faltar o saber ainda vicejam as ervas daninhas da ignorância na sua invencível incapacidade de compreender. Hélas! "

Nenhum comentário:

Postar um comentário