quinta-feira, 5 de abril de 2012

Racismo no futebol

Por Adriano Lopes e Bruna Vieira
PUC-Rio 2006

Nota-se que a origem do racismo é um assunto complexo e bastante delicado, que provoca diversas discussões filosóficas, sendo, por muitas vezes, objeto de estudo de diversos sociólogos. Há indícios de rivalidades tribais desde a criação das primeiras sociedades, porém o motivo das divergências não era a cor da pele e sim diferenças morais, religiosas e culturais. A afirmação de que existem raças superiores e inferiores foi utilizada muitas vezes para justificar a escravidão, o domínio de um povo sobre outro, e os genocídios que ocorreram durante a história da humanidade. Contudo, estudos de diversos antropólogos, cientistas e sociólogos do mundo todo já provaram a não existência de qualquer possibilidade de superioridade racial. “(...) nada, no estado atual da ciência, permite afirmar a superioridade ou a inferioridade intelectual de uma raça em relação a outra(...)” diz Levi- Strauss em seus estudos.
A maioria dos cientistas crê que o etnocentrismo seja universal. As histórias míticas da origem de alguns nativos brasileiros servem como bons exemplos. Os índios urubus, que viviam no vale do Pindaré, no Maranhão, acreditavam que todos os homens vieram da madeira. Porém, eles diziam que haviam vindo das madeiras boas, enquanto seus vizinhos se originaram das madeiras podres. “Não existe nenhum relato da existência de sociedades tribais em que não tenha existido o etnocentrismo”, diz João Baptista Borges Pereira, da USP. O motivo é apenas um: o etnocentrismo reforça os laços entre os grupos, estabelece fronteiras entre eles e os demais grupos e, de quebra, levanta o moral das pessoas.
No passado, os gregos costumavam chamar de “bárbaro” todas as pessoas que não falavam a sua língua. Porém, quem conseguisse aprendê-la, não encontraria complicações e não seria mais chamado de “bárbaro”. O problema começou a modificar no final do século XV, quando a Inquisição espanhola obrigou os judeus a se converterem ao catolicismo. Porém, a maioria desses “novos cristãos” continuou praticando os seus ritos, insistindo em manter suas tradições. Isso fez com que os católicos acreditassem que existia algo de errado no sangue do judeu que impedia a conversão. Os gregos então decidiram evitar a miscigenação, com o objetivo de impedir que esse sangue ‘impuro’ se espalhasse pela população. Nessa mesma época,
os europeus chegaram à África e à América e encontram negros e índios, seres humanos muito diferentes dos padrões culturais e físicos os quais eles estavam acostumados. O encontro entre os povos foi impactante para ambos, e sem saber como agir, os europeus se basearam na passagem da Bíblia em que Canaã, fi lho de Noé, embriaga-se e acaba condenado à servidão (Gênesis 9, 20-25) para justificar a escravização dos africanos.:
“E começou Noé a cultivar a terra e plantou uma vinha. Bebeu do vinho, e embriagou-se; e achava-se nu dentro da sua tenda. E Cão, pai de Canaã, viu a nudez de seu pai, e o contou a seus dois irmãos que estavam fora. Então tomaram Sem e Jafé uma capa, e puseram-na sobre os seus ombros, e andando virados para trás, cobriram a nudez de seu pai, tendo os rostos virados, de maneira que não viram a nudez de seu pai. Despertado que foi Noé do seu vinho, soube o que seu filho mais moço lhe fi zera; e disse: Maldito seja Canaã; servo dos servos será de seus irmãos. Disse mais: Bendito seja o Senhor, o Deus de Sem; e seja-lhe Canaã por servo. Alargue Deus a Jafé, e habite Jafé nas tendas de Sem; e seja-lhe Canaã por servo. Viveu Noé, depois do dilúvio, trezentos e cinqüenta anos. E foram todos os dias de Noé novecentos e cinqüenta anos; e morreu. “
“Para eles, até àquele momento, a humanidade era somente a Europa. O conceito de branco não existia antes de eles conhecerem o índio e o negro”, diz Kabengele.
O racismo possui motivos bastante práticos. “Ele é uma maneira de levar vantagens sobre outras pessoas e manter privilégios”, afirma a coordenadora do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades, a psicóloga Maria Aparecida Silva Bento.
No Brasil, o racismo remonta ao período colonial. Nesse período, a escravidão aplicada na colônia sustentou a economia da metrópole durante mais de três séculos e, após a abolição, esses escravos foram colocados à margem da sociedade, sem condições de desenvolvimento econômico, social, político e cultural. “A escravidão – o direito reivindicado pelos colonizadores, por meio da força, de utilizar trabalho negro para enriquecerem – define que trabalho é coisa de raça inferior”. Emir Sader.
Mas, voltando à nossa reflexão inicial: Por que depois de tantos anos de convivência, manifestações explicitamente racistas voltam a atormentar o futebol?
Cada vez mais imigrantes de países pobres, principalmente da América Latina, África e Leste Europeu, invadem a Europa em busca de uma vida digna. Não são poucos os casos de barcos
que naufragam cheios de africanos próximos a costa européia, e não são menos aqueles que atingem seus destinos. Tal caso vem atormentando a população européia. Uma pesquisa publicada no jornal “El Mundo” mostrou que 70% dos espanhóis acham que o país tem imigrantes demais. Outra pesquisa mostra que a criminalidade vem aumentando e, é claro, relacionam o crime ao imigrante. “Trinta por cento das mortes e dos ferimentos são obras de criminosos estrangeiros”, afirma a manchete de um jornal espanhol. Assim, a população começa a enxergar o imigrante como um inimigo.
O primeiro caso explícito de racismo no futebol atual foi justamente na Espanha contra um jogador camaronês. Tendo acesso a esses dados sobre o número cada vez maior de imigrantes na Europa e sobre a opinião de europeus sobre eles, é claro que devemos relacionar esses fatos. A situação insustentável na África, que durante séculos foi explorada pelos europeus, está levando seus habitantes à imigrarem para Europa e, como no passado, os europeus estão reagindo às diferenças com racismo. E o racismo das ruas está sendo transferido também para o futebol.

BIBLIOGRAFIA
“Globonews.globo.com”. Acesso em 28 de abril de 2006
“globoesporte.globo.com”. Acesso em 28 de abril de 2006
“Hotel Ruanda”. Direção de Terry George , 2004.
Rex, John. “Raça e etnia na teoria sociológica”, Lisboa, Editorial Estampa, 1987
Arendt, Hanna.“Pensamento racial antes do racismo”, Origens do Totalitarismo, Cia das Letras

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