Na Copa de 58, Mané Garrincha comprou o rádio mais caro que tinha
numa loja de Estocolmo, 60 dólares. “E você entende sueco?” – perguntou o
massagista Mário Américo. E ligou o rádio, deslizando o dial por várias
emissoras. “Tá vendo? Só fala sueco.” E comprou o rádio de Garrincha pela
metade do preço.
Garrincha não sabia lhufas de ondas sonoras. Nem o mais elementar
bê-á-bá. Que a emissora propaga ondas eletromagnéticas no espaço, o rádio capta
essas ondas, amplifica e o alto-falante as converte em ondas sonoras. Entendeu?
Não? Eu também não. E depois dizem que Garrincha é que era burro.
Zé Maria Pereira Gomes me mandou uma crônica de Ruy Castro, na
qual, para falar da descoberta do Bóson de Higgs (ou “a partícula de Deus”), ele
cita o escritor Conan Doyle, quando Watson descobre que Sherlock Holmes jamais
ouvira falar de Copérnico. E, pior, não sabia que a Terra girava em torno do
Sol. “Que um homem civilizado desconheça este fato em pleno século 19 me parece
extraordinário”, exclamou Watson perplexo. “Se girássemos em torno da lua, não
faria diferença para mim e para o meu trabalho”, retrucou Sherlock (que nos
livros de Doyle, pelo menos, jamais pronunciou juntas as palavras “elementar,
meu caro Watson!”).
Ruy diz na crônica que, quando ouviu falar em aplicativo pela
primeira vez, pensou que fosse um novo tipo de esparadrapo. “Apesar disso,
estou cultivando um certo carinho pelo bóson. Aliás, já fui grande fã de seus
primos mais velhos, os prótons, elétrons e nêutrons – e também nunca soube do
que se tratava. Claro que, com tantos e súbitos admiradores, o bóson pode muito
bem passar sem mim. E eu sem ele.”
Dirijo carro desde os 12. E, modéstia à parte, bem. Mas nunca abri
capuz de carro nenhum. A não ser pro frentista checar nível de óleo, água,
essas coisas. Gasolina e álcool, como se sabe, são altamente inflamáveis. E
motor, dizem, é a explosão. Vôte! E se explodisse justo na hora que eu fosse
abrir o capuz? Tá doido! E o avião, hein? O poetinha Vinícius de Moraes sabia
das coisas: “é mais pesado que o ar, tem motor a explosão e foi inventado por
um brasileiro. Não pode funcionar.”
Um médico amigo meu diz que jamais faria ginecologia. “Com tanta
intimidade e conhecimento de causa, a coisa perderia a graça, o encanto, a mágica.”
Será? Sei não. E os buracos negros, meu? Como não tenho a menor intimidade com
o tema, sempre os imaginei medonhos e tenebrosos. Segundo a Teoria Geral da
Relatividade, buracos negros são regiões do espaço das quais nada, nem mesmo
objetos que se movam na velocidade da luz, pode escapar. Resultam da deformação
do espaço-tempo causada por uma matéria maciça e altamente compacta. Sacou? Eu
também não. Mas que mete medo, mete. “Nada pode escapar.”
O italiano Antonio Meucci inventou o telefone (e vendeu o
protótipo do aparelho a Graham Bell) há mais de cem anos. Todo mundo sabe como
funciona. Ondas sonoras geram uma corrente elétrica que varia de intensidade e
frequência, gerando vibrações que são transferidas magneticamente a um aparelho
distante que, ao vibrar, reproduz o som original. Não tem mistério. Não? Apois
tá certo.
Tirar coelho de cartola, fazer a partner flutuar sobre o palco e
adivinhar carta de baralho não passam de truques, ilusionismo, prestidigitação,
a gente tá careca de saber. Agora, telégrafo sem fio, telefone, rádio,
televisão, internet... aí, meu, não tem cascata. E eu só quero saber como é que
se liga e desliga. Sou adepto fervoroso da teoria de Sherlock Holmes: o cérebro
é como um sótão que, se atulhado de objetos – ou informações – impede que se
encontre o que se precisa. Elementar, meu caro leitor.
O mundo é mágico, como dizia Guimarães Rosa. E meu lugar é na
plateia. Modesta. E humildemente.
Joca Souza Leão é cronista.
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