segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Ai, como eu sou intolerante.

Por Carlos Fialho

Escrever crônicas semanais aqui no Novo Jornal ou textos opinativos no meu blogue pessoal (blogdofialho.wordpress.com) me obrigam por vezes a pisar nos calos de alguns. Normal. Uma coluna autoral como esta serve para expressar a opinião de quem a assina e isso nem sempre agrada a todos que a leem. Não raro, os próprios colunistas são também alvos de críticas por suas palavras contrariarem interesses ou posições de outrem.

Porém, venho até aqui dividir com vocês certa preocupação. Temo tornar-me um “intolerante intelectual”, aludindo de forma preconceituosa o louvável trabalho de beneméritos natalenses. Evito fazer parte, mesmo que involuntariamente, do setor da mídia que se diz “engajado” e “intelectualizado”. Estremeço ante a aterrorizante possibilidade de me converter em um redator demasiadamente refinado, um colunista acadêmico ou (O horror! O horror!) um blogueiro progressista. Deus que me defenda!

Será que tenho alimentado em meu ser uma odiosa e abjeta persona que faz da incompreensão, agressividade, preconceito e inveja, os propulsores de uma modalidade de crítica parnasiana? Uma necessidade de falar mal dos outros pelo simples ato ou efeito de falar mal dos outros? Ou, quem sabe, eu encontre, no hábito de criticar com cáustica picardia e demolidora perspicácia a subentendida afirmação de que os defeitos alheios ressaltam sobremaneira minhas “inegáveis qualidades”? Será que tenho sido invadido por tais armadilhas da vaidade? Venho sendo assaltado pelo veneno do ódio e da ambição desmedida? Será que sou um patrulheiro ideológico? Escondo, mesmo sem dar-me conta, simpatias partidárias dissimuladas?

Refleti demoradamente sobre todas estas questões, deitado em uma rede na varanda, contemplando o mar e lendo “América” de Robert Crumb e “O Capote e outras histórias” de Nikolai Gógol (percebam bem o “redator refinado” e “colunista acadêmico” em todo o seu esplendor, já que me utilizo deste parágrafo apenas para exibir diante de vocês minha cultura expressa no gosto pela leitura e no involuntário álibi de autores que nem estão aqui pra se defender. Tudo isso, claro, disfarçado de uma pretensa despretensão, ao citar o hábito simples de vislumbrar a natureza no embalo da rede. Fecham parênteses.).

Após pensar sobre minha condição atual cheguei à seguinte conclusão: eu sou sim um terrível e incorrigível intolerante.

Sou intolerante contra o culto à ignorância, a ode à burrice, a devoção explícita à mediocridade natalense que acabará por definir nossa identidade de povo de segunda classe e será eternizada junto às futuras gerações.

Sofro com a revolta que aflora em mim diante de parlamentares conterrâneos que votaram no próprio aumento de salário.

Rio desgostosamente para não chorar de políticos que não fazem nada a não ser namorar celebridades gostosas dotadas de coeficiente intelectual equivalentes a suas próprias cabecinhas ocas, enquanto promovem festas exclusivas.

Nutro um irreversível preconceito contra aqueles que desviam dinheiro de escolas, ambulâncias, estradas, das secretarias de educação, do Foliaduto, do DNIT, da SEMOB, da PQP!

Tenho verdadeiro asco de todos os que recebem suborno para aprovar projetos que contrariem as leis do município \ Estado\ país, que recebem um por fora para facilitar atos moralmente condenáveis e até mesmo para realizar trabalhos que até são favoráveis à população, mas que só saem do papel após um reforço na remuneração do secretário \ assessor \ gerente \ diretor.

Desaconselho o contato com qualquer um que tenha um histórico de calotes e maracutaias, que mesmo faturando milhões, nunca cogitem saldar as dívidas do passado, que acreditem que o fato de terem se tornado ricos possa servir de fator redentor a sua vida pregressa, mesmo que alguns “amigos” afirmem isto, até mesmo em colunas de jornal.

Passo mal ao constatar que o atrofiamento dos córtex cerebrais conterrâneos seja a regra, a prática usual, o único caminho da nossa juventude e que, quando alguém tenta sugerir uma revolução por meio da educação, os poderosos de plantão acreditem que a melhor via é o corredor da folia.

Não tolero em qualquer hipótese o egoísmo desenfreado que molda nosso jeito de ser, a total e absoluta falta de consideração pela cidade, pelos demais cidadãos, visível nas pequenas contravenções cotidianas, desde o lixo que jogamos no chão, passando pela trancada que damos no trânsito e pelo troco a mais que nos recusamos a acusar e devolver.

Fico estupefato com jornalistas que defendem a “livre iniciativa” de favorecerem este ou aquele grupo político e depois saem se dizendo imparciais. Ah, façam-me o favor!

Divirto-me com alguma condescendência ao perceber tantos colegas autoelogiosos em nossas páginas impressas ou na blogosfera local. “Eu dei tal notícia primeiro”. “Eu sou amigo de beltrano”. “Eu sou foda!” Mal sabem eles que elogio, pra valer de verdade, tem que vir dos outros.

Enfim, são muitos os sentimentos impuros a serem sufocados em meu coração. Preciso fazer um persistente trabalho de reabilitação, um constante exercício de amor ao próximo, de compreensão. Posso até ficar amigo, sei lá, do Presidente da Assembleia, Deputado Ricardo Mota, tornando-me seu fiel escudeiro e incondicional defensor, estando junto dele se um dia ele se tornar, digamos, vice-governador. Ou quem sabe, eu posso até passar a ser o último natalense a gostar da Micarla. Poderia também virar fã de alguma banda de forró da cidade. Olha aí que beleza: “Vou não. Posso não. Minha mulher não deixa não.”

Ou então continuo sendo o mesmo intolerante intelectual que tenho me revelado. Esse monstro que ressurge no Novo Jornal todos os sábados com sede de vingança, para praticar um injustificável e perverso patrulhamento ideológico.

Ai, como eu sou intolerante


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