O ser biônico – prefeito, governador ou senador –
de todas as violências foi a bactéria mais terrível que até hoje infecciona a
democracia brasileira. Principalmente os mandatos executivos conquistados sem
voto, pela força das dragonas. O campo fértil onde nasceram as lideranças
comunitárias e a propaganda governamental. Até hoje, os seus criadores – os
políticos – pagam o preço dos monstros que criaram em suas fabriquetas de
líderes substituindo o laço da palavra com a arte da retórica pelos fogos de
artifícios.
A segunda geração de governadores biônicos foi
marcada por uma busca artificial de popularidade e o instrumento nasceu de uma
ideia em muito reforçada pelos setores conservadores católicos a partir da sua
experiência na mobilização da comunidade: os conselhos comunitários a partir da
criação das Secretarias de Trabalho e Bem-Estar Social. Nos conselhos nasceram
as ‘lideranças’ já que não poderiam ser chamadas de ‘líderes’. E foram essas
lideranças, à época, os operadores das generosas verbas sociais.
Como essas lideranças nasciam do oportunismo e não
de formação política – este o traço positivo e salutar os governos não copiaram
da ação social católica e sua conscientização – transformaram-se, por
deformação, em exploradores dos cofres públicos municipais, estaduais e
federais. O modelo gerou a proliferação de conselhos e centros e as
‘lideranças’ passaram a exercer a intermediação entre o governo e a comunidade
em troca de mobilização política quando das eleições proporcionais que estavam
mantidas.
O cancro político, para usar uma expressão dos
portugueses quando se referem ao câncer, acabou por virar um monstro que hoje
escraviza os políticos, do vereador ao governador. A corrente vai da liderança
ao vereador e ao prefeito, destes ao deputado estadual e depois federal,
alcançando o senador e o governador. Sem exceção. Uma corrente, mas com uma
correia de transmissão que impulsiona as suas cremalheiras e direcionada para a
obtenção de vantagens distribuídas às comunidades como migalhas.
O pouco escraviza e não liberta e, por isso, os que
recebem ficam dependentes e pedem mais às vésperas de cada eleição. A própria
ação social católica refugiou-se sem forças em ações isoladas diante de um
mercado persa instalado em cada comunidade. A liderança é um ser invisível e
insaciável a buscar nas tetas dos políticos, quando não direto nos favores
governamentais, a manutenção do próprio status e a parcela que deve distribuir
a todos aqueles que sabe subjugar e manter sob a proteção de sua liderança.
A síntese
está fielmente numa história vivida aqui. Um candidato, já eleito, chamou um
amigo que tivera gestos sem condicionar a recompensas, e perguntou o que queria
ser. O amigo agradeceu, e repetiu o que sempre disse: nada. Mas, com o bom
humor de sempre, brincou: só aceitaria se fosse para ser uma liderança.
Liderança? Perguntou o amigo eleito. E ele completou, soltando uma gargalhada:
Não precisa de cargo, pede o que quer, não presta contas de coisa nenhuma e não
é obrigado a cumprir compromisso
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